“Estou lendo dois livros simultaneamente, porque nunca consigo ler um só, são sempre alguns. Agora, digamos, um é por trabalho e outro por prazer. O primeiro, por dever de ofício, é Jango, a biografia do presidente escrita pelo Jorge Ferreira. E estou gostando muito. Parece um romance, porque é uma prosa fluida, instigante. O personagem é trabalhado de um jeito muito especial. Então estou achando muito bom.
Mas quero falar mais do que estou lendo por prazer e lazer. É Divórcio, romance recém-lançado pelo Ricardo Lísias. O livro passeou pelas páginas da crítica literária, porque é baseado em histórias reais, vividas pelo autor. Algumas pessoas vão se aproximar desse livro pela fofoca, pelo prazer de bisbilhotar a vida do outro. Tem isso, claro, mas para mim não é o que mais chama a atenção. Divórcio tem uma prosa maravilhosa, como tudo que o Lísias faz. Não o conheço pessoalmente, mas acho sempre muito bom o que ele escreve. É um texto que se lê rápido, é fácil. Mas por outro lado, é um texto que não se esquece. Ele fica e leva a reflexões. No meu caso, como trabalho como jornalista, atento demais aos fatos, o que me prende a esse livro é uma reflexão sobre a fronteira que separa – ou une – o que é o fato e o que é sua recriação. O que é subjetivo no fato objetivo. É uma literatura de boa qualidade que me toma como leitor porque me faz pensar sobre isso. Como biógrafo estou o tempo todo refletindo sobre como a narrativa histórica é, de alguma maneira, ou de muitas maneiras, uma reconstrução. Nunca escrevemos o fato tal qual ele foi, esse relato sempre passa por subjetividade, inclusive pela memória, que é seletiva e traiçoeira. E depende sempre do dono. Por isso é que Divórcio me encantou, esse embate entre a criação e o fato e quanto tudo isso é influenciado pelas subjetividades. Estou gostando muito.”
LIRA NETO é jornalista e escritor, autor das biografias de Castelo Branco, Maysa, padre Cícero e Getúlio Vargas