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Educação

Problema: como resolver problemas?

By 02/09/2011One Comment

A criança tenta uma, duas, três vezes. Não consegue encontrar a solução. No rosto, a expressão cristalina de ponto de interrogação, certa decepção, a reforçar a baixa auto-estima e uma sensação de ‘não sei mesmo fazer essa coisa’. Para o professor, fica a frustração, o ‘não consigo ajudá-la nessa tarefa’. A resolução de problemas é certamente um dos principais dilemas cotidianos da Matemática em sala de aula e foi o tema de uma mesa de debates realizada na manhã do sábado, dia 27 de agosto, no Congresso Brasileiro da área. A discussão reuniu Ruth Ribas Itacarambi, professora da Faculdade Osvaldo Cruz (FOC); Norma Suely Allevato, docente e pesquisadora da Universidade Cruzeiro do Sul (UNICSUL); e Antonio Vicente Garnica, da Universidade Estadual Paulista (UNESP). Foi mediada por Ricardo Rigo, do SINPRO-SP.

A primeira a falar foi a professora da FOC. Ela procurou inicialmente construir um conceito de Matemática, que, para os alunos, significa “estudar os números”; para os gregos, mestres em geometria, “dedica-se também às formas”.

Contemporaneamente, pode ser entendida como a “ciência dos padrões”, contemplando números, formas, raciocínios e probabilidades, que podem ser imaginários ou reais, virtuais ou mentais, estáveis ou dinâmicos, qualitativos ou quantitativos, utilitários ou recreativos. “Estamos falando de um processo criativo, com idas e vindas, que articula caráter descritivo e prática experimental”, reforçou.

Deixando sempre explícita que sua concepção de ensino é socioconstrutivista (“o aluno é sujeito social e responsável pela construção do conhecimento”), Ruth lembrou ser ainda fundamental definir o que é afinal um problema em Matemática. Trata-se, segundo a especialista, de “uma situação de dificuldade em que não há solução evidente”. Para a professora, uma das grandes armadilhas relacionadas ao tema está no fato de os alunos em geral e não raro aprenderem a trabalhar com problemas como algo que não gera dúvidas, o que faz com que apenas procurem fórmulas que possam repetir. Outra complicação – há uma narrativa que muitas vezes os estudantes não conseguem acompanhar, e o enunciado torna-se estranho, incompreensível. “A Língua Portuguesa é fundamental”, definiu a professora.

Ambiente favorável à reflexão
Na proposta que ela sugeriu que seja aplicada em sala, é preciso levantar hipóteses, desenvolver estratégias organizadas e avaliar os resultados obtidos. Para tanto, é fundamental criar na classe um ambiente favorável à reflexão e à discussão, lembrar os alunos que o problema pode surgir de situações reais ou lúdicas, garantir espaço para investigação e o desafio (o espírito de curiosidade), reforçar a necessidade de interpretar corretamente o texto, incentivar o trabalho em grupo e destacar finalmente o papel do erro e da avaliação sobre o percurso desenvolvido. “É algo que só se aprende fazendo muitas vezes”, completou. Ela foi mais uma participante do Congresso a recomendar o uso de jogos, desta feita como estratégia de apoio pedagógico para o aprendizado de resolução de problemas. “O aluno vai ter de lidar com regras, entender proposições e objetivos, explorar situações, selecionar e experimentar diferentes estratégias e checar por fim seus resultados, para avaliar e questionar as razões da vitória ou da derrota”, ensinou.

Em sua exposição, Norma fez uma retrospectiva de distintas concepções que nortearam o ensino de problemas em Matemática ao longo dos últimos cem anos, revelando significativas transformações vividas nessa trajetória: no início do século XX, privilegiava-se a simples e instrumental memorização e repetição. Atualmente, há três principais correntes de pensamento: ensinar sobre resolução de problemas (um meio para atingir objetivo específico); ensinar para a resolução de problemas (técnica que se esgota no resultado encontrado); e ensinar através de resolução de problemas (parte do pressuposto de que se trata de uma atividade inicial, ponto de partida para muitas aventuras e descobertas).

Essencial também para a professora da UNICSUL é diferenciar exercício (que representa treino e repetição para o desenvolvimento de habilidades) de problema, algo que “não sei fazer, mas estou interessado em resolver”. Para ela, um problema é algo complexo, que permite múltiplas soluções, exige capacidade de interpretação, saber lidar com incertezas, além de muito esforço. “O complicado é que, em sala de aula, a maior parte das atividades preocupa-se apenas com o relembrar e repetir, sem abrir espaço para o nível superior, o do pensamento crítico e criativo”, lamentou.

“Ensinar através de problemas”
Ela indicou o “ensinar através de problemas” como caminho mais adequado a seguir e listou algumas etapas que devem ser percorridas com os alunos: para começar, preparação do problema, leitura individual e leitura em conjunto da situação proposta. Em seguida, alunos buscam suas próprias resoluções. O professor observa, incentiva e esclarece dúvidas, para na sequência registrar as respostas na lousa – é momento de compartilhar o conhecimento. “Chega então a hora de realizar a plenária, situação mais rica de aprendizagem, quando há debates, dúvidas, reflexões. Não é algo para ser feito com pressa”, continuou. Por fim, o educador deve buscar o consenso, para formalizar e sistematizar o conteúdo. “O estudante passa a compreender os significados daquele aprendizado. Os resultados têm sido muito satisfatórios”, comemorou a educadora. Mas ela reconheceu: não é fácil colocar em prática essa dinâmica com aulas de 50 minutos e mais de 30 alunos em sala.

Quem encerrou a mesa de debates foi Vicente, que aproveitou sua participação para disparar algumas instigantes e saudáveis provocações intelectuais. Lembrou que, em documentos produzidos e discussões travadas no século XX, na área da Matemática, já havia referências inúmeras e explícitas aos “saberes integrados”, ao “nunca aprendemos uma coisa só, de cada vez”, à necessidade de “desenvolver a linguagem e alcançar saber crítico” e ao fato de ser “fundamental conectar a Matemática com situações reais da vida”, como se fossem mantras matemáticos, repetidos à exaustão. O professor então questionou: por que, depois de 100 anos, essa discussão não mudou? E completou: “no entanto, se as indagações permanecem, o nosso cotidiano em sala e os nossos alunos mudaram de forma considerável”. As perguntas não pararam por aí: “será que um problema que sugere compras em um mercadinho faz sentido para a criança de hoje? Será que não há nas políticas educacionais uma preocupação exagerada em sempre estabelecer relações da Matemática com o cotidiano? Será que a gente consegue mobilizar os alunos com situações tão usuais ou corriqueiras? E será mesmo que estamos de fato oferecendo problemas que problematizam?”.

O texto termina aqui. Mas continuamos todos a refletir sobre as provocações sugeridas pelo professor da Unesp.

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