Leonardo Padura, escritor cubano, autor do romance histórico “O homem que amava os cachorros” e de vários livros policiais, como “Morte em Havana” e “A neblina do passado”.
“Mario Conde é um personagem que me acompanha há 25 anos, desde o meu primeiro romance, “Passado perfeito”, publicado em 1990. Ele nasce sem a consciência de que seria duradouro e seguiria em outras histórias. É um detetive que sabe absolutamente nada sobre técnicas de investigação criminal. É muito inteligente e funciona levado pela intuição e pela sensibilidade. É um homem cheio de contradições, elemento que provavelmente foi responsável por estabelecer a conexão dele com os leitores. Ele não usa arma, tenta ser normal, fuma muito, bebe também. E no final faz bem o trabalho dele. A partir do quinto romance, Conde se converte em vendedor e comprador de livros usados. Pensei muito nesse novo ofício dele. Dessa forma, continua muito próximo das ruas e também da literatura. Em ‘Herege’, que estou lançando, ele faz participação especial e é testemunha que ajuda a elucidar um crime. Ele ainda está vivo, começa a narrativa numa cama, acordando e olhando para um calendário que marca a data de aniversário dele, 60 anos. Está atormentado, refletindo sobre a chegada da quarta idade, achando que não conseguiu chegar aonde queria. Os leitores dos meus romances policiais devem já ter se dado conta que minha literatura tem basicamente um caráter social. O mais importante é a história de vida, a crônica de uma sociedade contemporânea confusa, perturbada e complexa, para assim chegar ao mistério. É o que Mario Conde vai fazendo. Essa consciência crítica, que vem de inspirações literárias como (Manuel Vásquez) Montalbán e Rubem Fonseca, é o mais importante, o atributo que oferece ao gênero policial a capacidade de ser boa literatura. Um grande problema que tenho quando escrevo é a falta de imaginação. É verdade. Sofro muito com isso. O enredo policial é um pretexto que uso como forma narrativa para montar uma história. Em geral, quando começo, a partir de uma situação que pode ser mais ou menos crítica, um conflito, nem eu nem o Mario Conde sabemos quem é o assassino. A partir daí, começo o processo criativo. Escrevo e reescrevo, levo em média dois anos para terminar um livro, porque quero que tudo funcione com a máxima integridade estética e literária. Gosto de começar sem saber o mistério – é como se eu estivesse lendo o romance que estou escrevendo”.