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Destaque

Vai faltar água. E agora?

By 20/02/2015No Comments

Elisa Marconi e Francisco Bicudo

Crédito: Sabesp/Divulgação

As perguntas daqueles que lidam com educação estão agora fazendo são: como lidar com a seca? Como abordar? Como estimular a comunidade escolar a se posicionar diante da crise? A geógrafa Stela Goldstein defende que o ponto de partida deve ser o reconhecimento da gravidade da situação. “O primeiro passo é parar de falar que é algo que vai acontecer no futuro. Não é crise hídrica, é colapso hídrico. Já está acontecendo e veio para ficar”. Stela é diretora executiva da Associação Águas Claras do Rio Pinheiros, entidade que monitora e busca recuperar o Pinheiros e seus afluentes. A ideia é, então, encarar o problema com a real dimensão e impactos que ele provoca e, a partir daí, descobrir as atuações mais desejáveis e buscar soluções.

O passo seguinte, segundo a geógrafa, é a escola se enxergar como um ator social e adotar a causa da água como uma bandeira. Pode parecer uma medida formal, mas não é. Tomar uma posição pode ser o ponto de virada entre se calar ou agir. Para Stela, quando a escola chama para si a responsabilidade de enfrentar o tema da crise hídrica, está se movimentando em direção a uma mudança cultural. “Abordar a crise é uma excelente oportunidade de tratar transversalmente as questões ambientais que tocam as regiões metropolitanas do Brasil”, ensina. E segue: “A disponibilidade ou não de água tem correlação direta com a forma de ocupação dos territórios, o desmatamento dos mananciais, a insuficiência de investimento em saneamento básico, a ocupação de beiras de córrego, o lançamento de esgoto e resíduos sólidos em locais indevidos, entre outros”. Sem esquecer, claro, a ausência de investimentos em obras relevantes, a falta de planejamento, o descaso com alertas feitos desde 2003 e a soberba do governo estadual nos cuidados com a crise. Quando o colégio e seus professores decidem ampliar o debate sobre essas questões tão delicadas e tão cotidianas, necessariamente começa a aparecer reflexão, crítica, proposta e disposição para atuar.

O resultado dessa empreitada pode ser tanto prática, “com alunos, professores e funcionários aprendendo a reduzir o consumo, reutilizar água, evitar desperdício de toda ordem”, aponta a diretora executiva da Águas Claras do Rio Pinheiros, como política, o que pode ser mais interessante e duradouro. “Tudo isso pode desembocar numa mudança na maneira de cobrar o poder público. A escola pode ser um lugar de entendimento de que não basta votar, é preciso cobrar. Muitas vezes aceitamos calados decisões e iniciativas que são danosas para a sociedade toda. A questão aqui é ensinar, aprender e discutir como os governos se responsabilizam ou não pelos problemas ambientais e, neste momento específico, pela disponibilidade ou não de água”, provoca Stela.

Saindo do plano das ideias e partindo para a ação, a especialista sugere uma atividade prática que pode surtir bom efeito. Toda escola tem água perto. Seja em forma de córrego, seja aterrada, a água está lá. Assim, a proposta é promover uma expedição com os alunos para encontrar essa água que serve à região da escola. “A água está presente em todos os lugares, o que fizemos comumente foi canalizar e aterrar. É vital que os alunos sejam levados a percorrer seu território, onde moram, onde estudam e tal, para reconhecer os sinais da existência de água”.

Ela reforça que investigar as águas do entorno convida a olhar para a vegetação, o lixo, os bueiros, amplia o entendimento do ambiente, do uso e da degradação. Só que a expedição pode continuar. A geógrafa do Águas Claras gosta de levar os estudantes para conhecer os córregos e as nascentes dos córregos, ainda em terras urbanas. “Aí eles veem que a água nasce limpa, perto deles até, e que vai se poluindo no decorrer do caminho, vai sendo aterrada até sumir de vez. Isso gera um grande impacto”, assegura. As vivências sensibilizam fortemente e complementam os trabalhos feitos em sala de aula, que não precisam estar restritos à disciplina de geografia ou de ciências. “É um projeto transversal e só faz sentido se for assim. Os professores de história podem falar da trajetória de ocupação, os de química podem falar de contaminação e descontaminação, os de biologia podem falar dos impactos na saúde humana, por exemplo”, afirma Stela.

Para conseguir fazer isso, a geógrafa reforça, é preciso constituir uma aliança na escola. Direção, professores, alunos e funcionários trabalhando juntos para reduzir drasticamente o consumo, combater o desperdício, trazer o assunto para discussão e, principalmente, fundar politicamente “uma nova cultura da água, porque a escassez de água veio para ficar, e a escola é parte fundamental nisso”, conclui.

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